Durante audiência pública realizada pela Comissão Mista Especial da Lei Kandir nesta quarta-feira (27), para debater a regulamentação da Lei Complementar 87/1996, os governadores dos principais Estados exportadores pressionaram o Ministério da Fazenda para aumentar a compensação da Lei Kandir e pagar o retroativo, visto que as perdas dos Estados e municípios têm atingido números cada vez maiores.
O ministro interino Eduardo Guardia, por sua vez, foi taxativo ao explicar que qualquer criação de despesa permanente à União deve vir acompanhada de uma compensação no lado das receitas ou pela redução de outros gastos. “Devo lembrar aqui que a decisão que for tomada sobre compensações tem que respeitar o Teto de Gastos” – observou.
Ao reconhecer que a compensação prevista pela Lei Kandir é, de fato, impositiva e que deve constar do Orçamento da União, Guardia disse, no entanto, que “a Constituição não obriga a União a compensar Estados retroativamente por desonerações de exportações”. Para ele, “não há que se falar em passivo, em débito da União. O texto constitucional não abre nenhum espaço de discussões sobre o passado”, pontuou.
O ministro interino completou ainda dizendo uma das propostas da Fazenda seria unir os repasses da Lei Kandir com os recursos do Auxílio Financeiro para Fomento das Exportações (FEX), mesmo reconhecendo que o valor final ainda ficaria aquém do demandado pelos Estados.
O relator da comissão mista, senador Wellington Fagundes, afirmou que seu relatório vai buscar o equilíbrio e o consenso, com um texto que seja possível de ser aprovado e cumprido. “O testemunho dos governadores é muito importante para esta comissão e para o relatório que iremos elaborar. Por isso queremos ouvir sugestões de todos os envolvidos para balizar as decisões que a comissão deve tomar” – acentuou.
Simão Jatene, governador do Pará, taxou os atuais repasses do Governo Federal aos Estados de “insuficientes e injustamente distribuídos”. “As perdas são muito maiores para alguns Estados. O Pará e Mato Grosso, por exemplo, exportam cerca de 30% do PIB, ou seja, já começamos podendo tributar apenas 70% da economia”, alegou.
O governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja, reclamou da necessidade de os governos estaduais praticamente implorarem à União por esses recursos todos os anos. “Estamos sempre com o pires na mão pedindo o ressarcimento à Fazenda. A balança comercial brasileira cresceu à custa dos Estados e municípios”, concluiu.
Entenda o caso
No ano passado, o STF estabeleceu prazo até 30 de novembro de 2017, para que o Congresso Nacional regulamente a Lei Kandir. Se até essa data não for aprovada uma norma com esse objetivo, o Tribunal de Contas da União (TCU) ficará responsável por fazer os cálculos da compensação. A Comissão Especial pretende apreciar o projeto em plenário até dia 20 de novembro.
A lei em questão isenta da incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) as exportações de produtos primários e semielaborados, ou seja, não industrializados. Até 2003, a lei garantiu aos Estados o repasse de valores para compensar perdas decorrentes da isenção de ICMS, mas, a partir de 2004, a Lei Complementar 115/2002, embora mantendo o direito de repasse, deixou de fixar o valor. Com isso, os governadores precisam negociar a cada ano com o Executivo o montante a ser repassado.
Na primeira audiência pública realizada pela Comissão Especial Mista, a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas do Pará (Fapespa) apresentou dados que apontam que, em 2016, os Estados brasileiros registraram perda líquida de R$ 25 bilhões na arrecadação em razão da Lei Kandir. Já no período de 1997 a 2016, as perdas líquidas acumuladas atingiram R$ 268,9 bilhões. Os Estados mais prejudicados foram Minas Gerais (R$ 64,6 bilhões), Rio de Janeiro (R$ 60,7 bilhões), Pará (R$ 35,7 bilhões), Mato Grosso (R$ 30,8 bilhões) e Espírito Santo (R$ 28,3 bilhões).
A região Centro-Oeste foi a que mais perdeu recursos relativos (8,72%) em 2016. A região Norte apresentou a segunda maior perda relativa (5,35%), seguida do Sudeste (3,64%), do Sul (3,04%) e do Nordeste (0,87%). Entre os Estados, o Mato Grosso teve a maior perda proporcional em comparação às receitas (26,01%), seguido pelo Pará (14,58%), Rio de Janeiro (8,13%), Espírito Santo (7,59%) e Minas Gerais (6,75%).